O Jardim Estranho da Minha Terra

Na minha terra há um jardim estranho. Onde as flores não crescem, porque não são plantadas. São as pessoas que, em romaria, as levam.
Há dias de cortejo e, nesses dias, é quando as pessoas são mais generosas e levam mais flores. São os dias em que plantam sementes de madeira, num buraco fundo.
Que regam com lágrimas.

Neste

Neste jardim estranho, não há casais de namorados.
Oh, não,
Este jardim estranho não recebe muitas visitas.

Raramente pessoas mais novas, só em dias de cortejo.


Neste jardim estranho, há casasinhas baixas, de pedra, na alameda principal. Têm uma porta, nenhuma janela.
Neste jardim, não há bancos, mas há mesas baixas, para as flores.
Neste jardim, não há luzes eléctricas, mas há velas. Mesmo de dia, há velas acesas.

Não são apenas flores e velas e sementes de madeira que se plantam. Também letras e números. E fotografias, pequenas. Pequenas esculturas, também. Como anjos.

As mesas baixas, as casinhas, os amontoados de terra, tudo está devidamente numerado. tudo tão organizado. Nem parece um jardim.

O muro que rodeia este estranho jardim não é como os outros. É alto e não tem grades e só podemos ver para dentro dele pelos grandes portões. As pessoas não falam muito deste jardim. Não há visitas de estudo, só mesmo cortejos esporádicos.

Há um segredo escondido. Foi a minha avó que me contou. É que, em cada casinha, mesa baixa ou amontoados de terra, há uma história, como um tesouro, enterrada. Cada uma dessas histórias está guardada na memória daqueles que visitam este jardim.




E os anos passaram desde que este estranho e estranhamente belo jardim deixou de se chamar jardim. Agora, toma outro nome, algo mais feio. Para mim, porém, será sempre o meu estranho jardim.
Nestes dias, assim ultimamente, é mais frequentado por jovens. Não muitos, mas mais. Com uma certa regularidade. Jovens que não esperam pelo cortejo.

Eu também o visito. Tomo sempre o mesmo percurso, nada de mais. Seguir pela alameda principal, até à última das casinhas de pedra, virar à esquerda, número 20.
Dou um longo suspiro e deixo-me encostar. A rir ou a chorar, repito para o ar, a cantiga de todas as vezes:
- Então, Joanna?

1 críticas: (+add yours?)

Unknown disse...

De facto, um texto fantástico! Do melhor que li nos últimos meses. Parabéns