Dança do Puré

Quieta como uma estátua.
Não mexe, senão estala.É do brilho desta sala.

Colher e prato sem se tocarem.Engolindo sem fazer barulho.Tento ignorar mas não consigo.


É aquele tremelicar, o tlim tlimde uma colher de sopano prato da sopa.


Não se ignora.Então olho.Está velho, velho.


O braço treme, todo o corpo dança.Como se um sismo abalasse(Ou o comboio fosse eterno)


Fecho os olhos, mas o somnão se ignora.Está velho, velho.


Eu não me mexo,estátua de cristal,senão estalo.


Olho para outro lado.Movimentos agora ágeisDe quem já fez muitas rendas.


-Quem?Repete e faz repetir.Outra vez.

-Eu já lhe disse.Movimentos ágeis,mas o que se esconde?



Estátua de cristal,
não deverias ouvir.
Pelo canto do olho espreito"

"E vejo um reflexo de mim
que nem parece eu.
Atrás de mim roça

O manto da Dona Morte.

Respiro fundo.

Há uma qualquer confusão na cozinha.
Uma disputa pelo esforço.
-Eu trago que ainda tenho braços.

A bengala de lado para trazer o segundo prato.
Toda a panela treme, todo o corpo treme.
É a triste dança do puré.

Como choram as estátuas de
cristal límpido?
Não choram porque estalam.

Fecho os olhos e
atrás de mim, um estrondo,
braços demasiado tremidos.

O puré conclui a sua dança
na imensidão do tapete.
Amarelo sobre azul.

Quero chorar,
olho para outro lado.
Velha, velha, à minha frente.

Sorri.
-Já sei. 1989.
E tu és…?